quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Carta do Couto e Osseloa - 1117


900 anos da carta do Couto de Osseloa (1117 - 2017)

A CARTA DO COUTO DE OSSELOA

«Este notável documento constitue a certidão de nascimento e de batismo de Albergaria-a-Velha e, mais do que isso, atribuem-se-Ihe ainda foros de maior valor para a nossa nacionalidade, considerando-o o primeiro documento em que Portugal figurou com o título de reino.

Alexandre Herculano, História de Portugal, 1.ª Edição, 1.º volume, pág. 244, em nota.

Quando o bispo de Coimbra, D. Egas, em 1258, fez transcrever a Carta em pública-forma, para garantia da sua conservação, declarou que assim procedia por utilidade de Albergaria-a-Velha de Meigon Frio. E era Velha, certamente para contrapor a outra Albergaria de mais recente fundação, e que devia ser a Nova.

(...)

TRADUÇÃO DA CARTA

A tradução da Carta mereceu-nos o maior cuidado. Confiando-a ao Sr. P.e Francisco Teixeira fixámo-la como segue:

Saibam quantos tiverem conhecimento da presente escritura, que, quando intentámos a reforma para utilidade de Albergaria-a-Velha de Meigonfrio, Dom Mourão, do burgo de Vouga, nos mostrou uma Carta não rasurada, nem viciada, nem cancelada, nem abolida, nem oferecendo dúvidas em qualquer das suas partes, a qual nós, por Gonçalo Mendes, nosso público tabelião, fizemos transcrever palavra por palavra, e reduzir a pública-forma, e cujo teor é o seguinte:

Em nome da Santa e Indivisa Trindade, Pai, Filho, Espírito Santo, Amen. Esta é a Carta de Benefício e firmeza de Couto, que eu, Infanta Dona Teresa, Rainha de Portugal, mandei fazer para ti, Gonçalo Eriz com destino à tua Quinta de Osseloa (Assilhó). Em primeiro lugar divido, por um lado, essa tua Quinta com a Terra de Santa Maria, a saber: – da estrada que desce de Portugal (Porto de Gaia) em direcção à Pedra da Águia (Bico do Monte ou Monte da Senhora do Socorro), e daqui pelo meio da Mata Talhada (ficava entre a Pedra de Águia e a Cruz de Canelas, e se denomina hoje Vale da Salgueira e Vale da Lage) em direcção à Mata da Ussa, que antigamente se chamava Mata da Brava, e daqui à Mamoa Negra que se chamava da areia, e daqui vai ao Romariz, e daqui, por outros terrenos, até ao têrmo do Vouga; na direcção de Romariz transpõe o regato de Osseloa junto à Charneca, seguindo em linha recta até ao ponto em que o terreno deixa de ter o mesmo plano (Usque in Directo), e daqui voltando para os vales de Osseloa e depois directamente à Fonte Fria, que outrora se chamava Fontinha de Meigonfrio, e daqui a par da estrada em direcção à Pedra de Águia supramencionada.

Aprouve-me, a mim, Infanta Dona Tereza, Rainha de Portugal, em boa paz, dar-te Carta de Couto a ti, Gonçalo Eriz, na Quinta de Osseloa (Assilhó) pelos limites referidos, a saber: – da própria Quinta até ao Padrão do Couto, que eu mandei colocar na parte norte à beira da estrada, (é conhecido ainda hoje pelo nome de Marco da Meia Légua), e assim outro tanto para o poente da Quinta, e para o sul na direcção dos vales de Osseloa, do outro lado do regato, e volta para a Fonte Fria junto ao Sobreiro assinalado, e dali atravessa o caminho para o Oriente, indo em direcção ao limite de Valmaior até ao Vale Pequeno, onde roubam e matam os viandantes, e dali, da primeira fonte situada abaixo da estrada, seguindo em direcção ao norte até ao padrão do Couto.

Desta forma, de hoje em diante, possuas este Couto, bem como aquele que da tua descendência for teu herdeiro da dita Quinta, e de pai e mãe de ti provenha, tanto por teres dado um açor a D. Mendo Bofino e um cavalo ao meu escudeiro Artaldo e um gavião a Godinho Viegas, como para uma Albergaria que vamos instituir neste lugar, ao cimo da estrada, para bem de nossas almas e das dos nossos pais, e nela metamos como Albergueiro a Gonçalo de Cristo, e, quando um tiver falecido, tu nomearás outros, e da tua herdade lhes darás onde trabalhem, a saber: – desde a primeira lagoa dos Sobreiros, no caminho que vai para Osseloa até à primeira margem do regato que decorre da estrada, estendendo-se pela mesma margem até à estrada; e dessa lagoa indo para a primeira Mamoa que está junto à estrada; tendendo para a Fonte Fria, e depois, do outro lado, no termo de Valmaior – cedamos, eu, tu e os nossos sucessores, acima do Padrão do Couto para o Oriente, até à primeira Fonte, abaixo da estrada, e daqui à primeira Fonte Fria.

Além disso, determinamos que paguem ao Albergueiro do Couto, aqueles que o ferirem, quinhentos soldos, e ele não pague calúnia em todo o meu reino, nem passagem (direito de trânsito), nem fique sujeito a quaisquer encargos (nenhum fôro); e além disso, Gonçalo Eriz, honro-te na tua Quinta, ordenando que todos os monteiros que, no termo dela, matarem veados, te dêem os lombos e a quarta parte, com excepção do rei; e os que matarem corça ou gamo te dêem cs lombos, e, se caçarem em terreno cultivado, te dêem metade, e do urso as mãos, e se afastem do Couto os caçadores de coelhos à distância da vista de homem de joelhos, com os olhos nem levantados nem postos no chão; e todos os que aí fizerem calúnia te paguem pelo fôro do Vouga, e aquele que violar as disposições deste Couto te pague seis mil soldos, e mantenha-se o Couto, – e se quiseres utilizar-te do meu Mordomo para receberes aqueles seis mil soldos, dar-lhe-ás a terça parte, mas não por fôro, e não entre no teu Couto se não for da tua vontade.

E, se alguém da minha descendência, ou eu ou o Rei, quiser anular este meu acto, seja maldito até ao fim dos séculos, e aquele que o beneficiar seja bem dito e toda a sua geração; e todos os homens de Vouga que honraram este Couto participem da boa hospitalidade da Albergaria. Confirma P., Bispo do Porto. Esta carta foi lavrada nas terras de Santa Maria, a que chamam Feira, no mês de novembro, era de 1155. Eu, Infanta Dona Teresa, Rainha de Portugal, que mandei passar esta Carta a ti, Gonçalo Eriz, como acima se deixa dito, e de minha mão a firmei.

Foram presentes: – Mendo, escrivão privativo da Côrte que a fez. – Dom Pedro Gonçalves, confirmo, – Dom Mendo Bofino, confirmo, – Dom Velasco Ramires, confirmo, – Dom Godinho Viegas, confirmo, – Didaco Osório, confirmo, – Dom Gonçalo Truitzendo, confirmo. O Armeiro Nuno Soares, viu. Pelágio Scapulado, confirmo. Artaldo testemunha, Pedro, testemunha. – Pelágio, testemunha, Gonçalves, testemunha, João testemunha, Garcia, testemunha. Sinal público em cruz, com as letras – Rainha Dona Teresa. Rainha.

E para que a dita carta, com o decurso do tempo, não venha a oferecer dúvidas, nem desapareça, com dano para a mesma Albergaria, a fizemos conferir na presença de homens bons, e, além disso, depois de firmada com o nosso próprio selo, a fizemos arquivar cuidadosamente no Tesouro da Igreja Catedral de Coimbra. E eu Gonçalo Mendes, Tabelião público na Cúria do supradito Prelado, fiz a leitura pública da referida Carta, e a examinei como acima fica dito, e a transcrevi palavra por palavra, e por meu punho a reduzi a pública-forma, e lhe apus o meu próprio selo. Feita na Igreja de
Santa Maria de Lamas, 13 Calendas de Maio, era de 1296.»

Albergaria-a-Velha e a seu Concelho – Dr. António de Pinho

N.º 2 Publicação Semestral da Junta Distrital de Aveiro Dezembro de 1966

ANO DE 1117

Escreve-se, invariavelmente, que a Carta do Couto d'Osseloa é do ano de 1117, quando nos aparece datada de 1155. Indicaremos a razão da aparente divergência, que a muitos causaria confusão.

Em Portugal vigorou a era de César até 15 de Agosto de 1422, data em que D. João I ordenou fosse substituída pela era de Cristo, em harmonia com a reforma Gregoriana. Até então todos os documentos se datam, pois, da era de César, que começou 38 anos antes do nascimento de Cristo. De modo que, para se encontrar o ano de Cristo, que corresponda a outro da era anterior, basta deduzir a este 38 anos, diferença entre o início das duas eras.

OSSELOA

Osseloa, a que a Carta se refere, passou a denominar-se Silhó ou Assilhó, nome actual da pequena povoação que dista 200 metros desta vila. Em vários documentos do século XIX ainda aparece com o nome de Silhó.

Era ao tempo uma aldeia ou um casal, circunscrito, talvez, à casa solarenga de Gonçalo Eriz, habitada pelos solarengos que agricultavam as terras do fidalgo, fertilizadas pelas águas do regato de Osseloa.

Contra esta afirmação não faça dúvida a Carta designar Osseloa por villa, palavra que então tinha apenas o significado de Quinta, Granja, ou Casal nobre.

ACORDÃO DE 1629

O Ac. da Relação de 10 de Junho de 1629, proferido sobre questões em que se discutiam direitos a terras do Couto d'Osseloa, chamava-lhe villa d'Osseloa. Deu isso margem a ser-lhe dirigida a seguinte petição (...)




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