quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Albergaria-a-Velha 1944

ALBERGARIA-A-VELHA — Lápida comemorativa da fundação de Albergaria, nos Paços do Concelho Albergaria-a-Velha

No seu próprio nome tem Albergaria-a-Velha o certificado da sua origem. Em Novembro do ano de Cristo de 1117, isto é, ano de 1155 da era de César, passava a infanta-rainha D. Teresa, mãe de D. Afonso Henriques, nosso primeiro Reí, uma carta de privilégio a Gonçalo Eriz, coutando-lhe a sua vila de Osseloa (hoje o bairro de Assilhó, desta vila), que confinava com terras de Santa Maria (Feira), onde a carta foi assinada.

As demarcações das terras do Couto de Osseloa são muito interessantes, pela especialidade dos lugares que nomeia, designados já alguns dêles em português no meio do latim bárbaro da carta.

A onomástica topográfica é característica, como se vê pelos seguintes nomes, alguns bem conhecidos ainda hoje:

Mata talada, Mata da Ussa, Mata da Brava, Mamoa Negra, Romariz, Rio de Osseloa, Charneca, Fonte Fria (hoje lugar das Frias), que se chamava também Fontinha de Meigonfrio. A carta de Couto foi concedida com a cláusula de estabelecer e sustentar uma Albergaria próximo da estrada. Gonçalo Eríz presenteou alguns servidores da Rainha, que assistiram à feitura da carta e a assinaram. A D. Mem Bofíno e a Artaldo, escudeíro da Rainha, deu um rocím e a Godinho Viegas um gavião. O primeiro albergueiro ou seja o primeiro habitante de Albergaria de nome Gonçalo de Cristo, seria pôsto pela Rainha.

Para se demonstrar quanto era agreste o território da nossa vila, e a ela circunjacente, bastará notar que a carta de Couto dá fé da existência de veados, corças, gamos e ursos.

As albergarias eram utilíssimas instituições de previdência, ponto de refugio dos viandantes que se viam perseguidos pelas quadrilhas de malfeitores de tôda a espécie que infestavam o país naqueles rudes tempos medievais. Na carta de Couto declara-se que o sítio onde se fundava a Albergaria era escolhido de preferência pelos salteadores, que ali vinham roubar e matar os transeuntes.

A carta de Couto não existe no original mas em cópia autêntica, incluída em outra do Bispo de Coimbra, D. Egas, datada do ano de 1258. Publicou-a João Pedro Ribeiro a pág. 243, do 1.° volume das suas «Dissertações cronológicas» (Doc. n.° XXXVI).

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A primitiva Albergaria foi-se transformando e passou a chamar-se hospital, instalado em uma casa baixa, que foi modernamente a cadeia pública. Na parede exterior dessa casa estava a seguinte lápida, do século XVII.

«A casa do hospital, servindo de cadeia, foi vendida pela Câmara Municipal, em 10 de Setembro de 1905, pela quantia de 1.050$00, ao falecido sr. João Patrício Alvares Ferreira, que ali edificou parte do seu conhecido palacete da Boa Vista e que a actual vereação adquiriu destinando-o à habitação dos magistrados desta comarca.»

A lápida foi depois incrustada no interior do edifício das novas cadeias, de onde saíu para os Paços do Concelho, onde se encontra.

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Esta carta do Couto de Osseloa, no dizer de Alexandre Herculano, é o primeiro documento em que Portugal figura com o título de Reino, e daí o alto valor histórico que se lhe atribue.

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«... e Albergaría, possivelmente a mais antiga do País e a que, por isso mesmo, se deu o nome de Albergaria-a-Velha, continua a transformar-se, a progredir e, acompanhando, a par e passo, o movimento de forte impulsíbilidade que há onze anos a esta parte imprimem ao País os continuadores do patriótico movimento de 28 de Maio de 1926, aquele solo agreste e quási ínhóspito é duma, fecundidade exuberante e de tais recursos agrícolas e pecuários que bem pode dizer-se que, em relação aos seus habitantes, se basta a si próprio, visto que dêle se extrai ou nêle se cria, com suficiência, milho, trigo, arroz, batata, vinhos, legumes, hortaliças, e aves de espécies diversas e gado bovino, suíno, caprino e lanígero, cujos mercados e feiras são abundantes.»

Sob o ponto de vista da organização associativa, Albergaria-a-Velha e o seu concelho vem seguindo também a marcha evolutiva da época que passa e, orientada por um princípio disciplinado e dísciplínador, contam-se já, no seu âmbito, numerosas colectividades ou associações de valor entre as quais é justo destacar a Misericórdia de Albergaria, a Associação de Socorros Mútuos, a Corporação e a Banda dos Bombeiros Voluntários, o Grémio Recreativo, o Sporting Club e o Arregaça Foot-Ball Club, em Albergaria; as Bandas de Música de Angeja e S. João de Loure, a Tuna de Valmaíor, a Casa do Povo, em Alquerubím, e a Fundição «Alba».

Comercialmente, Albergaria tem-se desenvolvido também nestes últimos anos, porque, e isso é óbvio, se vêm surgir, por cada lado estabelecimentos de todos os géneros e é crescente o movimento e número de transacções que se verificam nos seus diversos mercados e feiras, entre os quais merecem especial menção o mercado semanal de Albergaria e as feiras mensais de Angeja, em 26 de cada mês, da Branca, nos dias 9 e 22, e ainda o de Albergaria que se realiza também mensalmente, no dia 19.

Mas, se o povo de Albergaria e do seu concelho é essencialmente trabalhador e activo, extraindo da terra, numa luta contínua, o pão de cada dia, é também, e disso se orgulha, um fervoroso crente, e, a par das suas crenças religiosas, de que não abdica, continua a manter o culto tradicional pelas suas festas e romarias, entre as quais, as maiores e de maior tradição e concorrência são: Senhora do Socorro, em Albergaria-a-Velha, no terceiro domingo de Agosto; à Senhora das Neves, em Angeja, no primeiro domingo de Agosto depois do dia 5; à Senhora da Alegria, no domingo de Pascoela.

Albergaría-a-Velha, a cujos destinos administrativos preside uma edilidade composta por homens de valor e de impoluto carácter, que incarnam, absolutamente, o espírito renovador do Estado Corporativo Português, não é agora aquêle ignorado «albergue para os pobres e passageíros» a que D. Teresa a destinou.

Já, a par do comércio, a indústria se desenvolve e vai levar bem longe o seu nome.

A Fundição «Alba», que é, no seu género, uma das melhores do País, e a melhor, sob o ponto de vista das instalações, salubridade e métodos de trabalho; a produtiva fábrica de Valmaior, da Companhia do Papel do Prado, a «The Cáima Pulp C.* Ltd.,» no lugar do Cáima — única no País, para produção de pôlpa para papel, a Fábrica da Branca da Emprêsa Cerâmica, as fábricas de olaria de Assilhó (Albergaria-a-Velha), Biscaia e Angeja, e as fábricas de serração de Alhergaria-a-Velha e Albergaria-a-Nova, evidenciam um forte desejo de desenvolvimento e de progresso que, aliás, se traduz nas obras já produzidas após o movimento de 28 de Maio e que a comissão administrativa da Câmara Municipal dêste concelho em efectividade há alguns anos já vai realizar e entre as quais avultam a continuação da abertura da Avenida de Assilhó, a construção de retretes públicas, lavadouro de viaturas e bebedouro para animais; a construção de cosas para pobres, na sede do concelho; a construção de lavadouros e fontes públicas; ajardinamento de largos em Albergaria e sedes de outras freguesias; captações e canalização de águas para fontes das diversos freguesias e da vila; reparações de ruas e de estradas de todo o concelho e vila; eléctrificação de algumas freguesias e instalação de postos telefónicos Públicos em Albergaria-a-Velha e outros melhoramentos de interesse geral, cujos projectos estão em elaboração.

Verifica-se, pois, que Albergaria floresce, se eleva e progride e, que do acanhado Couto da excelsa infanta-rainha, aos poucos se vai formando uma Albergaria maior onde, dia a dia, se albergam maior número de adesões e aplausos à obra gloriosa dos homens do Estado Novo, cujo chefe — Salazar — encarna todas e as mais elevadas virtudes da nossa Raça.
 
 Caminhos de Ferro do Vale do Vouga - Albergaria-a-Velha (1944, Gazeta dos Caminhos de Ferro nº 1363, ano LVI, 01/10/1944, pp. 511-519)

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